sexta-feira, 20 de julho de 2012

Amigos

Um dia uma amiga me falou sobre a importância de cultivar várias amizades. Talvez ela nem saiba, mas aprendi muito com ela naquela ocasião. Não que eu ja não soubesse o valor da amizade.  Mas não me dava conta dessa espécie de balé, onde os investimentos se distribuem, deslizam, se encontram e se afastam ao sabor da música que cada um pode tocar. Então ela me disse: com alguns você vai ter vontade de compartilhar coisas íntimas, com outros você vai querer rir de bobagens, com outros falar sobre o trabalho e alguns você vai querer por perto quando estiver sofrendo. 
Ela falou e eu pude ouvir. Isso foi muito importante por que antes, eu esperava que cada amizade fosse capaz de suprir tudo isso, que cada amigo fosse um pacote com todas essas "funcionalidades" e passava a só investir naquelas que eu imaginava poderem suprir essas expectativas.

O problema é que esperar que uma só pessoa corresponda a tudo isso, não só é quase impossível, como corre o risco de levar essa relação a uma morte por asfixia. Aliás, isso vale tanto pro amor, quanto para a amizade. Freud inclusive aponta para uma raiz comum a esses dois sentimentos. A amizade, assim como o amor, surge do investimento de pulsões sexuais sobre o objeto. Só que no caso da amizade o impulso sexual é inibido, impedido por resistências internas de ser alcançado. Nesse caso, diz Freud, ele passa a se contentar com certas "aproximações" á satisfação. Acho que era disso que a minha amiga estava falando. Ao invés de perseguir o objeto ideal (que na verdade não existe), aprender a dançar com a pulsão, usufruindo de todas as "aproximações" possíveis. O mais legal é que, segundo Freud, esse é o tipo de investimento que leva ás relações mais duradouras, "especialmente firmes e permamentes". 

Hoje consigo perceber e cultivar os movimentos singulares de cada amizade:

Tem aquelas de um tempo muito distante, que quase não encontramos mais. Talvez elas nem existam na atualidade da mesma forma como habitam nossas lembranças. Mas isso as fazem mais especiais, pois permanecem conservadas nas memórias com muito carinho. 

Tem aquelas com quem convivemos muito no momento. A gente se fala com muita frequencia, compartilha coisas mais íntimas, liga quando está triste e quando tem uma notícia feliz.

Tem aquelas que são amigas de sangue, nasceram na sua familia, mas para além do laço sanguíneo, tem um grande sentimento de amizade que nos une.

Tem os amigos de farra (Adoro!). Quando chega sexta feira a primeira coisa que voce pensa é em reunir todo mundo, jogar conversa fora, dar uma boas risadas.

Tem os colegas de trabalho que viraram amigos. Em meio ao ambiente ás vezes árido de trabalho, das relaçoes de poder, de disputas e hierarquias, germina uma flor. E de repente você percebe que quer ter aquela pessoa na sua vida, muito além daqueles mestros quadrados. 

Tem os amigos dos amigos que viram seus amigos tambem. E amigos dos irmãos, amigos dos filhos, etc. Essa espécie é muito querida, é como se fosse amigo ao quadrado, pois alem de gostar de voce gosta tambem do seu amigo.

E last, but not least, tem os amigos recentes. Novas flores que ainda não desabrocharam, mas por isso mesmo cheias de descobertas. Todo um mundo novo que se anuncia. Alguns você conhece pouco, nem teve tantas oportunidades quanto gostaria de estar com eles, mas nutre uma espécie de carinho em reserva, so esperando uma chance de estreitar esses laços.


Enfim, a lista poderia crescer ainda mais a medida que vou lembrando de pessoas. Mas o importante é saber que cada uma dessas delas tem um significado unico, qualidades unicas, defeitos unicos e que com cada uma delas voce pode sempre aprender. 

Não vou dizer nomes pra não correr o risco de deixar ninguém de fora, mas obrigada a você que se reconheceu nessas palavras. Se isso aconteceu é porque você é muito especial pra mim. Obrigada especialmente a minha amiga do inicio do texto. Sem você eu talvez demorasse mais pra descobrir tudo isso.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Teresa e a Praia



Rio de janeiro, patrimônio da humanidade, eleito por suas belezas estonteantes. Já haviam me falado, mas ainda não tinha tido a chance de experimentar os efeitos que aquelas imagens provocam sobre a retina de quem vê. A situação em que me encontro é, no mínimo, inquietante. Estou por lá a trabalho e, diga-se de passagem, um trabalho como nenhum outro. Trabalho em sua dimensão de produção, mas também trabalho do inconsciente. Intenso. No fim do dia a saída do local onde estou dá acesso privilegiado à praia de Copacabana. Posto seis da princesinha do mar. Não tive tempo de ver muita coisa, assim mesmo de roupa de trabalho fui até a praia e fiz uma foto (pelo menos mostrar que estive lá!). Em conversa com um amigo digo:
- aquele mar lindo ali fora e eu trabalhando. Mas fazer o que, se eu gosto!
- Do mar ou do trabalho? Pergunta ele.
- Dos dois, respondo. E penso comigo mesma: feliz do pescador que trabalha no mar!
Mas, moto-contínuo, lembro de Caimy, com sua voz lânguida, a falar das vicissitudes do pescador, aquele que tem dois amor. O pescador deseja, e no seu desejo se divide entre dois bens. Será que se angustia quando, em alto mar, pensa nas firmezas que o bem da terra poderia lhe trazer? Suspeito que, quando muito tempo aportado, acorda sobressaltado no meio da noite com sonhos de sereias, areias, alheias, do bem do mar. Desígnios insondáveis que atingem todo aquele que precisa recorrer á palavra para se dizer.
Li em algum lugar que a indecisão não é quando se duvida do que se quer. Ao contrário, eh quando se tem certeza do que se quer, mas pensa-se que deveria querer outra coisa. É uma forma bem humorada de colocar a questão, mas acho que insatisfatória. Porque o desejo não é a indecisão entre o que se quer e o que não se quer. O que não se quer não se cogita. Nem entra na história. O desejo é o paradoxo entre aquilo que se quer e aquilo que se quer, as duas causas em questão confrontando-se mutuamente. Duas faces de uma moeda condenada a ser apenas metade. Não existe a opção de juntar as duas parte e formar o um. Meia moeda, é o que lhe cabe, e é melhor saber fazer alguma coisa com ela.
Dias depois, ainda nas minhas andanças pelo Rio, conheci Santa Teresa e confesso que ela me encantou ainda mais. A princípio acredita-se estar apenas em mais um bairro. Não é preciso sair da cidade, dobra-se uma esquina e chega-se a Santa Teresa. Ali se trabalha, se mora, se vive, como em qualquer outro lugar. Mas essa simplicidade é enganadora. É todo um outro mundo que se revela a cada curva: a arte, o movimento de contracultura, a rebeldia, a criação, vão transpirando por seus paralelepípedos. O clima começa mudar com cara de montanha. Pequenos recantos escondem cheiros saborosos.
Ao contrário da beleza escandalosa de Copacabana, Santa Teresa é discreta e não se despe de um só golpe. Vai se insinuando ladeira acima, com curvas malemolentes, escondendo segredos atrás de portas entreabertas. Teresa, como toda mulher, não tem nada de santa. Sabe que a beleza vela e aponta para o indizível e, assim, precisa usar de disfarces.
A medida que vamos subindo, somos completamente tomados por seu feitiço até que, no topo de um castelo em ruínas o improvável acontece: abre-se, numa vista panorâmica, aquele cartão postal: praia, corcovado, cristo e tudo mais ali...aos nossos pés. Teresa agora é da praia, não é de ninguém, mas encena uma fantasia que nos faz acreditar sermos os amantes que sobre ela deitam seus olhos. 
Volto de lá com a impressão de que posso aprender algo com ela, algo sobre os "paradoxos do desejo"!